quinta-feira, abril 10, 2008

Stay away


Na primeira página do livro da Tashen intitulado “Graphic Design for the 21st Century – 100 of the World’s Best Graphic Designers” (Charlotte & Peter Fiell, 2003) está representada a imagem de um cartaz da autoria de um dos designers mais assertivos do novo século: o inglês Jonathan Barnbrook. No outdoor pode ler-se “Designers, stay away from corporations that want you to lie for them” numa colagem de recortes de pequenos anúncios de algumas das empresas mais conhecidas do mundo.
Este é o tipo de intervenções que organizações como a Adbusters(link) fomentam através de vários meios (revistas, internet, acções de guerrilha), no sentido de criar uma consciência social tanto naqueles que concebem a comunicação como naqueles que a percepcionam, seja ela de cariz comercial ou político.
No início da minha formação em design, foi-me dada a conhecer esta visão socialmente responsável exactamente através dos números da revista Adbusters. Apesar de estar muito centrada na realidade americana, bastou apenas folhear algumas páginas para perceber que o mundo da comunicação, e em particular da publicidade, não é tão irrelevante como inicalmente possa parecer. É certo que a publicidade serve para seduzir, criar fantasias e, no final das contas, vender. Mas muitas vezes tenta-se chegar ao resultado final pela via mais fácil, ou seja, através de falácias, deturpações, verdades fabricadas, incongruências e milhares de outros recursos irresponsáveis, mais ou menos subliminares, que escondem uma realidade totalmente contrária aquela que é comunicada.
Actualmente, temos o caso da Depuralina. Agora imaginem que pertencem à equipa de comunicação da empresa que quer comercializar a Depuralina e têm de comunicar um produto que toda a gente desconfia que contenha ingredientes nocivos para a saúde, para além de ser fabricada por uma empresa ilegal. Inevitavelmente, a não ser que se despedissem todos, teriam de fazer uma campanha a dizer que a Depuralina é um magnífico suplemento alimentar que ajuda a emagrecer e que, por ser tão bom, vai revolucionar o mercado.
Isto seria fácil para os gananciosos do dinheiro, os workaholics, os yesmen, os pré-destinados a presidentes ou para os bastonários dos fins que não olham a meios. Para aqueles que têm uma consciência inconformável, é como trabalhar numa cadeira eléctrica. A cada mentira, um choque eléctrico que nos aproxima do colapso. 
Ainda oiço o meu chefe a tentar incentivar o meu lado criativo: "Inventa!", ou a motivar-me para fazer um trabalho de qualidade: "Não penses, faz!"
... 
Existem sempre opções, dirão os optimistas. Liberta-te, solta-te, sai, foge, lança-te no vazio, sempre é melhor do que continuares na posição em que estás... E depois? Eu não sou o único a viver a minha vida. Há que assegurar a estabilidade acima de tudo, principalmente num país onde não existem oportunidades.
Como sempre, o meu estômago revolta-se. É o meu corpo a dizer que o meu espírito não está bem. Ao menos que algo dentro de mim se revolte...
É nestas alturas que me vem à ideia um artigo que li na referida revista Adbusters. Conta-se que um designer, que trabalhava numa empresa farmacêutica, descobriu que a empresa tinha ligações nazis. Não sendo judeu mas tendo consciência do que aquilo representava, criou uma campanha de quatro cartazes que publicitava um medicamento para as dores de cabeça. Nos cartazes, aprecia a imagem de uma pessoa que, com posturas diferentes, demonstrava dor de cabeça. Isolados, ou conjugados aleatoriamente, os cartazes mostravam apenas isso, uma pessoa com dor de cabeça. No entanto, quando a campanha foi para a rua, os cartazes foram colocados propositadamente numa ordem em que a posição do corpo e dos braços da pessoa formavam as letras da palavra “NAZI”. Com base nessa campanha, a empresa foi investigada e, pouco tempo depois, abriu falência.
No mínimo, inspirador.

3 comentários:

kimo disse...

Adbusters siempre!

Tou contigo amigo...

Estrelinha... disse...

Ter consciência nem sempre é bom. Em diversos casos era preferível não ter. Mas se não tivesses não serias tu e eu não gostaria tanto da tua pessoa. É revoltante, eu sei. É desesperante, eu sei. Mas pensa: é provocador para procurar algo mais. E até lá... Desculpa mas vai ter de ser!

Ou então, que tal uma ideia tipo NAZI no relatório de contas? :p

El Felino disse...

Lembrei-me de uma intervenção dessas, little star, mas novamente a minha consciência não mo permitiria...
Para além disso, o que se passa aqui não é de tão ampla gravidade. É apenas um nível épico de incompetência e prepotência. Desprezo tudo isso. Nem sinto vontade de retaliar. Sinto apenas vontade de sair deste lodo onde sinto que me estou a afundar. Preciso de dar um passo em frente. Não posso estagnar. (E com isto já são três palavras acabadas em "ar".)