À medida que vou celebrando a vida nas suas mais diversas etapas e representações (o nascimento de uma filha, um aniversário...), penso cada vez mais na minha morte. Sem ser propositado, não deixa de ser inevitável. Penso cada vez mais na eventualidade do acidente, da doença repentina, do desaparecimento precoce. No momento em que a nossa presença se torna fundamental para alguém que depende de nós, começamos a interiorizar a verdadeira importância da nossa existência. O que aconteceria se eu morresse? Da mesma forma que pensamos na importância da existência daqueles que amamos e que nos rodeiam. O que aconteceria se alguém que nos faz falta desaparecesse? O que subsistiria? O que ficaria por dizer? Quantos segredos guardaríamos connosco? Quantas palavras? Quantos desejos? Quantas memórias? Percebo agora que não é só uma doença grave que nos faz valorizar mais a vida. É a vida em si. É a necessidade dos outros. É o medo de perdermos aquilo que mais amamos. É o medo de deixar uma história incompleta. É o medo de deixar alguém que conta com a nossa presença, com a nossa ajuda, com o nosso amor, com a nossa amizade, sem esse auxílio. Sem aviso. Sem opção.
Há poucos dias, num livro, li um diálogo em que duas personagens discutiam sobre como seria a melhor forma de viver a vida. Uma defendia que a vida devia ser vivida como se cada dia fosse o último. Isto é algo que muita gente defende, principalmente a juventude, imagine-se. Para além disso, esta é a mensagem predominante de quem tem uma doença terminal, como se viu no recente exemplo do António Feio.
Mas neste diálogo, a outra personagem refutava o argumento da primeira e defendia que a vida não devia ser vivida como se cada dia fosse o último porque... e se não fosse? E as consequências? E o que se poria em causa só com a justificação de concretizar uma última loucura, um último desejo?
Se pensarmos bem, se nos questionarmos sobre o que faríamos se hoje fosse o último dia das nossas vidas, muito provavelmente fariamos algo que nos arrependeríamos amanhã. Viver "como se não houvesse amanhã" é o mesmo que tentar viver como se não houvesse mais ninguém no mundo. Mas o amanhã existe e não, não estamos sozinhos no planeta. Por isso, teremos sempre de fazer escolhas. E saber fazê-las é uma arte que nem sempre nos assiste com o devido talento. As causas e os efeitos sucedem-se e têm de ser encarados com a naturalidade que o nosso carácter permitir. É um passo que se dá a seguir a outro. E assim se vai seguindo, como se o estarmos cá amanhã fosse uma certeza inexorável...
2 comentários:
Ainda vais ter que me aturar muitos anos deixa lá! A vida é lixada...
Não vivo cada dia como se fosse o último, mas tento viver o hoje, o aqui e agora. Se assim não for, parece-me que nem desfrutamos devidamente "da vida em si". E isso não significa, necessariamente, que se andem a correr riscos ou a prejudicar os outros só porque sim. Há muitas pessoas com doenças terminais, cancro, ou outras, que percebem isso quando são confrontados com a sua mortalidade. E é nestes casos que, às vezes, parece que a doença se torna uma oportunidade de evolução e crescimento e tudo fica mais claro. Aprendem a viver e a apreciar este momento único que é o presente porque sabem que têm um futuro limitado. A questão é que todos temos o futuro limitado e às vezes vivemos como se fossemos inatingíveis, eternos e imortais. O "karpe diem" são se pode limitar ao "viver como se não houvesse amanhã", é muito mais do que isso.
Mas todas as teorias e opiniões podem mudar e assumem outro significada assim que nos vemos com um filho nos braços. Tenho dias em que sinto um medo avassalador de os perder ou de os ver sem mim ou sem o pai. É natural que assim seja...
Acho que já me estiquei um bocadinho :)
Beijufas!
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