sexta-feira, março 30, 2012

A insustentabilidade do ser...


Quarta-feira fui dar uma "palestra" numa empresa. Foi a primeira vez que fiz tal coisa. O nervosismo era muito e as ideias eram ligeiramente obscuras. A ansiedade era enorme e a responsabilidade era ainda maior. Tinha tudo para correr mal.
A apresentação intitulava-se "A Arte da Sustentabilidade". A empresa era de comunicação na área da sustentabilidade. E a intenção era dissertar sobre como a Arte pode ser uma forma de gerirmos a nossa própria sustentabilidade emocional e racional, por permitir quebrar barreiras de uma forma criativa e producente.
Sim, o meu nome do meio é El "Ultra-Ambicioso" Felino...
A conversa implicava também uma parte prática, em que cada uma das pessoas tentaria explorar um dos seus medos, desejos, sonhos, problemas, dúvidas, etc, de uma forma concreta (e quiçá, artística), com uma/numa simples folha de papel. Não me lembro bem como foi que tudo se passou porque aquela meia hora pareceu meio segundo. Só sei que a certa altura vi que aquela ideia maluca que eu tinha tido durante um almoço e tinha rabiscado na base de papel de um tabuleiro, estava a criar o efeito que eu desejava que acontecesse mas que nunca esperaria que realmente acontecesse. A honestidade com que as pessoas se entregaram a esta breve deambulação pelo seu íntimo, fez com algumas delas não conseguissem conter as lágrimas e a emoção. Estarreci. Aquela reação era nova. É muito dificil para mim ver pessoas chorar. Normalmente quando falo em público é para fazer as pessoas sorrir e aquilo baralhou os meus circuitos.
Felizmente tudo acabou bem e depressa. A ver vamos se me vou meter noutra aventura do género.
Quanto à ideia, surgiu-me (talvez por coincidência mas creio que não), numa altura em que andava com vontade de ver o documentário "Lixo Extraordinário". Já muita gente me tinha falado mas ainda não o tinha visto. Foi exactamente quando comecei a desenvolver a ideia para a apresentação que resolvi ver o filme e percebi a relevância do tema e o impacto que ele teve.

Depois de ver, mais do que o documentário, mais do que a parte criativa, mais do que a dura realidade que é mostrada, o que me tocou foi a parte humana. Não o facto de haver pessoas a viver do lixo, mas a parte da "ascenção" dessas pessoas pela via da criação artística. As obras do Vik Muniz não refletem apenas o que se passa na lixeira, elas retiraram da lixeira algumas das pessoas que, de outra forma, não teriam oportunidade de sair de lá ou de sonhar mais alto. A parte que mais me tocou foi quando o artista e a mulher discutiam se deveriam levar os "modelos" dos quadros para assistir ao leilão em Londres, dando-lhes a conhecer um outro mundo, um mundo de sonhos, de possibilidades. Nessa discução, o artista acaba por perguntar: "Mas porque é que haveremos de privar as pessoas de sonharem, mesmo que seja com algo muito difícil de alcançarem?" E essa, para mim, é a questão que define o filme. Tanto para as pessoas que trabalham no lixo, como para o artista que arrisca a vida para passar dois anos numa lixeira e tentar encontrar os sonhos subterrados sob toneladas de pesadelos.
Essa acabou por ser a essência da mensagem que tentei passar na minha apresentação. No entanto, depois de voltar para casa, lembrei-me que me faltou apenas dizer uma coisa: devemos encontrar forma de enfrentar os nossos problemas, mas para os conseguirmos resolver, temos de enfrentar um de cada vez. Da mesma forma que em "A Arte da Guerra" Sun Tsu diz que um túnel é a melhor forma de transformar um batalhão numa fila de pessoas únicas, também os nossos problemas devem ser eliminados um a um. Caso contrário, corremos o risco de entrar numa guerra que acabaremos por nunca vencer...

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