terça-feira, março 24, 2009

Living in (United States of) America...


Será que serei ostracizado por dizer que este filme me foi indiferente? Para além de achar que esta é a pior crítica que se pode fazer a um filme, sinto-me deveras afortunado por me ter sentido indiferente.
De facto, o filme não me tocou porque felizmente tive a sorte de não ter nascido nos EUA. Sim, porque o filme não trata de um assunto universal, trata de um assunto Norte-americano. E porquê? Porque o racismo/xenofobia na América é estúpido. Se há país que fez o favor de acabar com todas as possibilidades dos seus nativos (e seus descendentes) ostracizarem outras raças ou imigrantes de outros países é este. Muito menos tendo a raça ariana como referência. E muito menos quando uma das personagens (a rapariga chinesa) diz ao copinho de leite idoso “My brother sees you as a role model. Because you are a good person. Because you are American.” Americano? Sim, americano, mas descendente de polacos, assim como os filhos da menina serão americanos descendentes de chineses. Assim como toda a população dos EUA, excepto os descendentes das tribos índias que já lá estavam antes de serem dizimadas ou metidas em reservas, como se fazem com os animais em vias de extinção.
Numa sucessão de exemplos estereotipados de atitudes racistas em que o copinho de leite sai sempre como salvador da pátria e das meninas adolescentes (de arma em punho, diga-se) e de lições de moral de um padreco católico (que só ganha a admiração do protagonista quando manda os bons costumes à fava), a cena final faz com que todo o filme se torne ostensivamente redentor para a raça que mais pessoas matou em toda a história da humanidade, já para não falar do simbolismo inerente que, sinceramente, me fez cuspir uma bola de pêlo...
Com muitas potencialidades (para mim, o ponto forte do filme tem mais a ver com a relação das famílias onde, aí sim, podem-se comparar raças e credos sem ser preciso andar aos tiros), o argumento está repleto de clichês que ainda tornam a história mais falível (o veterano de guerra psicótico que aprende a gostar daqueles que andou a matar, os inimigos que se tornam amigos contra um inimigo comum, o velho durão e o puto aprendiz, etc, etc.), já para não falar dos actores secundários que deixam muito a desejar (excepto o barbeiro, o padre e o filho mais novo do protagonista que merecia ter ficado como papel do mais velho), fazendo com que as cenas sejam sempre pouco verosímeis e tenha de ser o velho Clint a segurar as pontas. Sim, porque só mesmo ele dá alguma consistência ao filme, apesar de, na minha opinião, nunca conseguir ser genial quando acumula funções à frente e atrás da câmara.
Definitivamente, mais vale uma Angelina na mão do que um Gran Turino a assapar.
A minha sorte é que, à noite, todos os gatos são pardos...

6 comentários:

Jo disse...

permita-me discordar. adorei o filme. :)

El Felino disse...

no discordar é que está o ganho... :) como o meu avô sempre disse, "se todas gostassem do mesmo, eu estava bem lixado"
;)

Alexandr3 disse...

Por essa ordem de ideias, nós afinal somos o quê?

todos vimos de algum lado.. os americanos, porque colonizaram... mas e nós? seremos visigodos? árabes? romanos?

Não vejo isso por esse lado..

El Felino disse...

Não quero dar aqui lições de história, mas há diferenças entre um país formado por conquista e um país formado por convenção. No entanto, não estou a dizer que os portugueses têm direito de ostracizar alguém. Nenhum país tem, exactamente porque todos os países resultam de misturas civilizacionais. Mas, por serem um país constituído por emigrantes de outros países (e não de aglomerados nómadas sem cultura autóctone), os EUA deveriam ser a nação onde não devia haver este tipo de questões por não haver uma raça dominante. A multiculturalidade é o ponto-chave da formação dos EUA (primorosamente explorada na cena do médico). Por isso, colocar um branco como salvador da pátria é dizer que os brancos é que são os maiores, que até dão a vida pelos oprimidos (Jesus ressuscitado? Please!). Os pretos são uns violadores, os hispânicos são uns assassinos e os chinocas são uns coitadinhos. Se não fosse o copinho de leite... Ou seja, o que eu acho é que o tema é pertinente mas é mal resolvido. Numa questão tão sensível, não deveria haver um mártir ou, no caso de haver, ter-me-ia tocado mais se fosse o miúdo a morrer. A mensagem de um final assim seria muito mais densa de significado (a impotência de um branco, por muito bem intencionado que seja, de resolver uma questão que atravessa todas as raças e credos, exactamente porque um branco vale tanto como os outros). Também seria interessante se o protagonista fosse de outra raça que não a ariana. Nesse caso seria ainda uma reviravolta ainda maior, já que a atitude altruísta atingiria patamares superiores. Os brancos estão demasiado estigmatizados com superioridade em tantas questões (sociais, históricas, etc) para ainda demonstrarem este tipo de redenção num filme. Era a mesma coisa do que um católico servir de mártir na faixa de Gaza. A partir daí não haveria condescendência para mais nenhuma religião.

Abraço!

Alexandr3 disse...

Obrigado por me teres contado o filme quase todo. Ainda não o fui ver.. :(

El Felino disse...

Oops, sorry... :/
Pensei que tinhas expressado opinião com conhecimento de causa. Mas assim já vais ver o filme enquanto espectador informado e poderás analisar o tema mais profundamente :)
Abraço!